Há 14 anos tinha uma musiquinha, mais
antiga que essa data, que eu trazia na cabeça “Ó, Abre ala que eu quero passar”.
Era esse o meu desejo, o nosso desejo, não por pretensão, mas por necessidade, queria
por vontade e desespero de quem se encontrou na vida, pedir espaço para estar
nele. O mundo do Teatro em lugar algum, de longe chega a ser um lugar fácil, de
perto é que não o é. “Sangue no olho” é a voracidade da sobrevivência em
qualquer instancia, e agarrando o seu com os dentes seguimos o enredo, “... que
eu quero passar”.
Sempre fui rebelde, de pequeno
conhecido por não ter causa, mas sempre soube que era essa minha rebeldia o
impulso primeiro para rebeldias maiores, a principal delas a persistência. E
assim, persistindo, encontrei, não cairei na pieguice de falar que encontrei
meu lugar no mundo, por rebeldia serei pior, encontrei o lugar que eu quero no
mundo. Engana-se quem entende destaque
ou fama ou prestigio ou calda do cometa ou rastro de meteoro. Esse lugar que
agora me encontro, com a sensação de dever cumprido, o lugar onde faço o que
gosto (ler-se amo).
- Ousadia, vamos ver onde vai dar. Disseram
alguns. – Ousadia de adolescente sem prumo. Outros. Sei que quando me vi com a
obra completa de Nelson Rodrigues nas mãos. - Ah! Impossível amar o teatro e
não querer faze-lo. Opinião minha, ressalvo. Sonhei enes projetos, montar cinco
seis dez todas de uma vez. Comecei por “Os
Sete Gatinhos”, peça do interior de uma casa que se deteriora com suas paredes
caiadas, vi no Sr. Nelson a dramaturgia literal da vida, percebi que ele antes
de qualquer desejo abria os olhos para o que estava embaixo dos nossos narizes.
Depois foi a vez de “Dorotéia”, um sofá e seis atrizes em cena, foi a minha
escolha, o dramaturgo para mim não queria falar de estética, especialmente
nessa peça que venera o feio. Ai veio à vez de “A Mulher Sem Pecado” por escassez
orçamentaria utilizei-me felizmente de criatividade e redescontruí uma casa sem
paredes onde de um cômodo podia se espiar o outro.
“Porque em casa você
pode fazer e dizer o que fora de casa você nunca pode. Para sua mulher você diz
e ela para você, você faz com seus filhos, e estas coisas estão, hoje em dia
começando a aparecer (coisa que eu já sabia e falava e as pessoas me achavam
"não sei quê"). Já está claro hoje em dia que o lar é o lugar mais
perigoso do mundo. Em nenhum outro lugar ocorrem tantas agressões graves, tão
sérias e tão impunes, onde o agressor tem a consciência de estar fazendo o seu
dever. A criança esmagada vai ficar "boazinha", ela está sendo
preparada para obedecer ao poderoso e entrar na pirâmide do poder porque a mini
pirâmide familiar já a treinou muito bem para isso” (Ângelo Gaiarsa).
Assim me apoiando em Ângelo eu via e
vejo Nelson Rodrigues. Agora que já não sou um intruso ousado adolescente,
creio eu, o que é uma pena. Sentindo-me mais maduro, de idade também quero
dizer, me aprumo para trazer aos palcos de Teresina “Perdoa-me por me traíres”,
uma peça que no seu interior guarda resquícios que levamos ou trazemos da rua.
Nela também alguns que me fazem sentir cada vez mais cumpridor de meu dever, atores
que, como eu, teimam em o ser. Rebeldes de olhos abertos que tentam ver o
teatro como importante para si e para o outro.
Não quero aqui, nem em momento algum
cair no erro de atiçar a fogueira das vaidades ou mesmo barrar a vontade de
alguns, mensurando o que pode ser dito ou esquecendo alguém. Quero apenas
agradecer e parabenizar a todos que nessa noite de estreia lançaram-se palco adentro
e dando o seu melhor para que possam ser melhores. Adriana Martins, Angélica
Araújo, Clerys Derys, Enzo Pietro, Gilmara Santos, Gislene Daniele, Gissele
Torres, Gleiciane Silva, Helio, Kaio Rodrigues, Lanna Borges, Leandro Mesquita,
Lorena Soares, Lucas Brito, Mary, Milenna Barros, Ronyere Ferreira, Wallance
Nunes.
Agradecer em especial alguém que como
que de casa, alguém como um daqueles que só se agradece na coxia, agradecer ao
ator Maneco Nascimento que sempre foi muito importante para as citadas montagens,
servindo-nos de seus sinceros comentários, compartilhando sempre da visão de
pesquisador cientista da arte teatral, que responsavelmente inspira o ator a
saber entender, ler e ver o teatro e o que nele consiste.
A Arimatam Martins, que me presenteou com o tal livro das obras completas de Nelson, e sempre mesmo que seja por obra do destino aparece e nos brinda com o toque de Midas.
A minha amiga irmã Janaina Alves que se faz presente em tudo desde que a porta da Oficina de Teatro Procópio Ferreira adentrou.
Parabéns a Nelson Rodrigues, que faz dessa flor por que sou obcecado motivo para não desistir.
Luciano Brandão
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